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  • Fabiana de Luna

Diabetes e Relacionamentos


Porque precisamos falar das coisas da vida...

“Não estamos em busca de um médico ou enfermeiro. Não estamos em busca de um psicólogo ou educador físico. Estamos sempre em busca de parceria, confiança, alguém com quem possamos contar de verdade, porque nem todos os dias são fáceis. Porque só o amor não basta”

Quando é o momento certo de dizer para o (a) paquera que você tem uma doença crônica? E como isso deve ser dito?

Será que esta pessoa vai me entender? Devo explicar tudo de uma vez, ou em doses homeopáticas?

São tantas perguntas que passam por nossa cabeça... Tenho vivido essas dúvidas ultimamente, e eu pensava que tinha uma ideia formada a respeito, mas a verdade é que nunca tinha parado para refletir, de fato, sobre o assunto.

Tentei rever meus relacionamentos de toda uma vida e tentar tirar algumas conclusões sobre minha própria experiência.

Sim, minha gente, fiz uma pequena entrevista com alguns antigos paqueras e com meu ex marido, para saber o que estas pessoas sentiram a respeito da minha condição de diabetes tipo 1, e como isso pode ter influenciado em nossos longos ou curtos relacionamentos. Vou contar algumas experiências para vocês, e ponderar ao final.

Quando eu tinha 16 anos tive um namorado durante o colegial. Éramos apaixonados, mas depois de um ano ele terminou comigo, chorando, dizendo que me amava. Não entendi nada, mas aceitei, segui minha vida, e anos depois ele me confidenciou que tinha terminado o namoro por insistência da mãe, que sabendo que eu era diabética, dizia que eu teria problemas de saúde, não poderia ter filhos, ficaria cega, etc.

Entrei para a faculdade e conheci, logo no primeiro semestre, o meu ex marido. Iniciamos ali uma história que durou 15 anos.

Há quase 3 anos estou solteira, e tive alguns curtos relacionamentos no meio do caminho. Foi aí que me questionei sobre o assunto, já que, sendo adulta, as coisas parecem ser mais difíceis do que quando somos jovens e simplesmente não temos medo do futuro.

Meu ex marido não se lembra muito bem de quando ou como eu falei sobre o diabetes, e eu também não me lembro, mas temos a certeza que isso não foi motivo para estranhamento. Às vezes isso é bom, porque sem saber da complexidade do tratamento e de uma vida com o diabetes tipo 1, as pessoas nem se questionam mesmo.

Vivemos uma vida inteira juntos, na qual eu sempre falei sobre o diabetes, compartilhava meus anseios, explicava sobre o meu tratamento, realmente em doses homeopáticas, porque esta pessoa me viu passando por diversos tipos de terapias, altos e baixos, enfim.

Hoje em dia, conversando, ele me disse que nunca se preocupou tanto porque sempre me viu como uma pessoa “normal”, e não como uma pessoa doente. Fiquei feliz por esse ponto de vista, porque realmente sei que nunca usei o diabetes para dar desculpas sobre qualquer coisa na minha vida. Minhas dificuldades eram reais, e agradeço por ele ter entendido isso.

Por outro lado penso que faltou, sim, muito envolvimento. Me confidenciou que, mesmo depois de 15 anos juntos, não saberia me socorrer de uma hipoglicemia em caso de inconsciência. Talvez eu tenha sido tão pró-ativa e independente com relação ao diabetes em toda minha vida, que ele não imaginou que um dia eu poderia realmente precisar de ajuda, e minha vida poderia depender de sua atitude.

Com outros paqueras a situação era diferente, pois foram relacionamentos breves, e não chegamos a ter convivência. Mesmo assim, perguntei, afinal, não tive como não falar do diabetes tendo que medir a glicose antes de um jantar, durante a madrugada, ou usando a bomba de insulina, que estava ali, grudada no meu corpo.

De uma forma geral, tive respostas positivas! Fiquei feliz em saber que o diabetes não influenciou negativamente nestas relações, que não foi impedimento para começar uma história, e que minha positividade sobre a vida os impactou de uma forma boa. Basicamente, fiz apenas 4 perguntas rápidas como:

Quando comentei sobre ter diabetes...

1) o que veio na sua cabeça?

2) isso te causou uma má impressão imediata? Ou não fez diferença nenhuma?

3) vc já me viu fazendo a glicemia, aplicando insulina, a bomba.... se sentiu como? muito estranho isso?

4) alguma impressão que tenha tido sobre esses fatos todos, que possa ter sido negativo, ou mesmo positivo?

Vejam algumas respostas...

Mas um deles me disse algo que me fez refletir um pouco...

O que eu tenho a dizer sobre isso?

Sim, o diabetes será SEMPRE uma terceira pessoa entre nós. Entre eu e o mundo, e será sempre a prioridade para mim, porque faz parte de mim, porque sou eu, porque é uma condição que não dá pra ligar e desligar, estará sempre ali, requerendo cuidado, atenção, dedicação. O diabetes não nos define, mas faz parte de nós, até que exista cura.

Talvez eu fale um pouco mais porque sou ativista, blogueira, não tenho receios de falar sobre um assunto que é tão natural para mim.

Então eu penso que o diabetes é um tipo de relacionamento, muito mais trabalhoso até, sem ao luxo de nem menos podermos terminar, botar um fim nessa história. É para ele que vou olhar antes e acima de tudo, porque ele sou eu, porque tem um corpo e uma alma que precisam ser cuidados e amados antes de tudo, antes de pensar em estar com outra pessoa, e isso não quer dizer que os relacionamentos são impossíveis, que não possamos amar e cuidar de outra pessoa, que não possamos viver uma vida normal, ter filhos, viajar pelo mundo. Mas é um fato que não pode ser escondido, ignorado, fingido.

E é por isso que eu questiono... quando e como devo falar para uma outra pessoa que eu preciso de cuidados, que minha rotina pode ser diferente, que meu humor pode mudar, que meu cansaço pode bater, e que sim, em algum momento vou precisar de ajuda?

Não sei. Não sei quando e como, porque isso depende muito do tipo de relação que se está desenvolvendo, mas a conclusão é que devemos nos colocar em primeiro lugar sempre, mesmo que isso signifique não estar com uma pessoa que não nos apoia ou não compreende.

Como iniciei o texto, não estamos em busca de um cuidador, para isso temos uma rede de profissionais ao nosso redor. Mas para estar junto de uma pessoa que tem uma doença crônica como o diabetes é preciso entender que sim, temos limites. Que sim, precisamos de planejamento para as coisas. Que em algum momento as coisas podem parecer mais difíceis, que às vezes não vai rolar sexo porque estamos com uma baita hiperglicemia que muda todo o humor e o próprio corpo, que bate um cansaço exagerado e implacável depois de uma hipoglicemia, que dói furar os dedos e se furar várias vezes por dia, e que às vezes um carinho ou simplesmente o silêncio, é mais do que necessário.

Mas afinal, é assim em todos os relacionamentos, de todas as pessoas! Mas não, não dá para esconder o diabetes e fingir que ele não existe.

Como dizia meu ex... “Este é um carma só seu, você precisa aprender a se organizar e fazer as coisas sozinha”. Isso me marcou tão profundamente, que me sinto na obrigação de dizer a todos os meus amigos e futuros pretendentes... sim, este é um carma só meu. Mas você deve aceitar e apoiar quando decidir estar comigo, porque apesar de eu me cuidar, fazer tudo sempre sozinha e tentar levar a vida mais saudável e normal possível, não é fácil, e preciso do seu apoio.

Não tenha medo de assumir o seu diabetes. Não deixe que ele controle a sua vida ou te impeça de ser feliz. Mas sim, é preciso muito mais que paixão e amor para estar com outra pessoa, além do diabetes. É preciso se doar, e entender que isso e qualquer outra coisa pode acontecer com ambos, e parceria é pra isso... na alegria e na tristeza, na saúde, e na doença... =)

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